quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Um golpe contra os quilombolas de Morro Alto?

A audiência publica realizada no dia 23 passado, na Assembléia Legislativa, e a ocupação da sala do presidente do INCRA Regional pelos quilombolas de Morro Alto, confirmou a afirmação popular de que a justiça não é para pobre. E, no caso, a lei também não.

Os invasores do Quilombo de Morro Alto, situado entre Osório e Maquiné, no litoral norte do Rio Grande do Sul, pretendem ficar com aquelas terras usando a força política de serem base do governo federal, apoiados no agronegócio – e outros negócios – e articulando-se para mudar a legislação federal que define a forma de reconhecimento das terras quilombolas. Para isto entraram com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN ), no Superior Tribunal Federal (STF), que está para ser julgada, e com um projeto de lei no Congresso.

Além de, no varejo da luta social dentro e no entorno das comunidades quilombolas, ameaçarem suas principais lideranças, dispondo para isto do apoio de integrantes da Brigada Militar como subsidiária.



Este cenário está em andamento. Deixando marcado quem domina quem, os latifundiários e políticos envolvidos, na tentativa de apropriação das terras quilombolas de Morro Alto, obrigaram a Casa Civil da Presidência e o INCRA nacional a introduzirem uma nova etapa ao processo de titulação daquele quilombo, de forma totalmente fora das normas e da lei. E este é um cenário nacional nos mais de 5 mil quilombos existentes no país.

Histórico
A Comunidade Quilombola de Morro Alto registra secular tradição de luta e resistência contra o Latifúndio. Mas a luta quilombola e negra na maioria dos quilombos, em todo o país, se faz contra os antigos latifundiários agora aliados a grandes empresas interessadas nos financiamentos dos projetos do PAC, como neste caso de Morro Alto. Os projetos, por exemplo, cortaram suas terras pela duplicação da BR 101, mas os quilombolas só tiveram o reconhecimento de direito à compensação após entrarem na justiça com uma Ação Civil Pública contra o DNIT. Mas mesmo com decisão favorável, a medida ainda não foi concluída devido a demora nos procedimentos de consolidação jurídica do Território.

Território e interesses
O Quilombo de Morro Alto é território ancestral da comunidade negra daquela região e vem perdendo tamanho devido as invasões de pequenos agricultores promovidas por latifundiários e políticos que pretendem assim terem aliados. Entre os principais representantes destes grupos estão os deputados federais Elizeu Padilha e Alceu Moreira.

Elizeu Padilha é ex-prefeito de Tramandaí, ex-ministro dos Transportes de FHC. É apontado pela PF e pelo Ministério Público Federal (MPF) como um dos principais articuladores do esquema de tentativa de fraude no inquérito que apura as licitações para a construção das barragens dos arroios Jaguari e Taquarembó, no RS. A parte do inquérito relacionado a Padilha que na tramita no Supremo Tribunal Federal, na ultima eleição ele ficou como o primeiro suplente. Com a nomeação de Mendes Ribeiro para o Ministério da Agricultura do PMDB acaba de assumir o mandato.

Alceu Moreira tem agropecuária em Osório onde já foi duas vezes prefeito e uma vez vice. Apoiado pelo agronegócio, mineração, pecuária foi eleito deputado estadual, sendo nomeado Secretário da Habitação e do Desenvolvimento Urbano no governo Germano Rigotto. No mandato seguinte, já no governo Yeda, foi eleito presidente da Assembléia Legislativa. Neste período o Superior Tribunal Federal autorizou que a Policia Federal o investigasse junto com Eliseu Padilha na operação Rodin, em que R$ 44 milhões foram roubados do Detran-RS.

Nova instância ilegal?
Os dois deputados, articulados com os atuais prefeitos de Osório, Maquiné e Tramandaí, juntos com o vice-presidente da república, Michel Temer, pressionaram para que a Civil da Presidência da República orientasse o INCRA nacional a requisitar o processo de titulação do Quilombo de Moro Alto, paralisando sua execução.

O processo para a feitura do Relatório Técnico de Iden­tificação e Delimitação (RTID) levou dez anos. Para que fosse publicado, os quilombolas tiveram que ocupar o INCRA em março do corrente ano, apesar das pressões do próprio INCRA, para que os quilombolas abrissem mão de parte do território herdado de ancestrais, uma área de aproximadamente, 4654 hectares.

Antes da AL, ocuparam o INCRA para protestar
Com o RTID, em vez do INCRA seguir para a próxima etapa, que seria da notificação dos invasores, dando a estes a possibilidade de recorrerem do laudo que fundamentou o RTID, pois há prazo legal para isto, o INCRA regional enviou o processo para Brasília, criando uma fase nova (ilegal) para o reconhecimento do quilombo.

As articulações da conspiração
Neste momento, as ameaças de morte as principais lideranças negras do quilombo se somam as articulação para a votação da ADIN, a suspensão do processo de titulação e a publicação de matérias na grande imprensa caracterizando os quilombolas como intransigentes e improdutivos. Um processo para construir no imaginário da população que existe um conflito por responsabilidade dos quilombolas.

A campanha acirra os ânimos, torna o ambiente belicoso e racista aumentando o potencial de conflito, ao que se soma a conivência do próprio INCRA ao não cumprir com suas atribuições legais.

O governo federal mostra na prática que não respeitas a legislação criada por ele mesmo, nem a existente no plano internacional, que ele subscreve. A OIT – Organização Internacional do Trabalho – define em sua Convenção 169, que qualquer medida administrativa envolvendo comunidades quilombolas, negras ou indígenas não pode ser tomada sem que estas sejam consultadas.

Negociações do mal
O presidente do INCRA regional, Roberto Ramos, pressionado pelos quilombolas que ocuparam as dependências daquele órgão no dia 23 de setembro, antes de seguirem para a audiência pública na Assembléia Legislativa, disse que assumia a responsabilidade pelo encaminhamento do processo para as instâncias superiores, e se negou a dizer quem o tinha requisitado. Ele, entretanto, já está orientado pelo Palácio do Planalto e o INCRA nacional. O processo agora vai depender de diversas negociações políticas, em diversos escalões de poder. Uma destas articulações será uma reunião que o INCRA regional vai promover na primeira semana de outubro, para a qual os quilombolas – foram informados - não estão convidados.

Texto: Luix
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